BR116 faz imersão na cultura russa para nova montagem

Para montar a peça “Cartas de Amor para Stálin”, toda a equipe da companhia BR116 fez uma imersão “fascinante” – nas palavras do diretor do espetáculo, Paulo Dourado – na cultura e na história russa.

“É como se de repente se abrisse uma cortina para um universo fantástico e que tem uma relação muito forte com o Brasil por causa do modernismo, por causa da arte contemporânea, e com relação aos sistemas políticos, a políticas culturais”, comenta Dourado.

O resultado da pesquisa do grupo trouxe referências musicais, literárias, cinematográficas e de artes gráficas que ajudam a compor a ambientação necessária ao embate entre o escritor e dramaturgo Mikhail Bulgákov e o ditador Josef Stálin, entre a produção artística e o poder do Estado.

“Estou enterrada de história russa”, brinca a atriz Bete Coelho, que em cena encarna tanto a esposa do escritor – este interpretado por Ricardo Bittencourt – quanto Stálin.

A concepção da moradia do casal, onde se transcorre a ação, diz a cenógrafa Flávia Soares, fica bem longe do realismo. “Foi uma delícia encontrar uma peça que se a no auge do construtivismo russo. É um momento que nós designers gráficos idolatramos e estudamos, então eu queria que meu cenário fosse meio que uma homenagem às artes gráficas do construtivismo russo”, explica ela.

Esse movimento, que toma forma na mesma época em que vem à tona a Revolução Russa de 1917, tem como característica o uso de formas abstratas e geométricas.

Projeções de imagens de Stálin e de cenas que remetam ao período em que a história se desenvolve ajudarão a compor o ambiente cênico. Esta parte audiovisual da pesquisa ficou a cargo do diretor de imagens Gabriel Fernandes, que assistiu a filmes e documentários russos, certas vezes até sem entender o que era falado neles, mas cujas sequências impressionavam. “Temos imagens riquíssimas, imagens de Stálin que muitas pessoas no Brasil ainda não conhecem.”

Além de querer construir um clima de insanidade e suspense, Fernandes pretende contextualizar a época com as cenas. “A projeção também tem essa coisa prática de facilitar o entendimento e fazer com quem o espectador possa ter uma catarse com a interpretação dos atores”, diz ele.

Entre as referências para ilustrar a grandiosidade do pensamento soviético daquele período, representantes do cinema revolucionário russo, como Sergei Eisenstein, diretor da obra-prima “O Encouraçado Potemkin” (1925), e um cineasta contemporâneo a ele, Vsevolod Pudovkin, que fez “A Mãe” (1926).

TEREMIM

Outro elemento importante para criar a atmosfera do espetáculo é música. O diretor musical Kleber Nigro conta que a trilha sonora original da peça será gravada ao som de piano e de teremim.

Este último, um dos primeiros instrumentos eletrônicos, foi criado pelo russo Léon Theremin em 1920. “Ele sofreu também a mesma perseguição política que o personagem Bulgákov sofreu. Acharam que ele estava fazendo uma arma de guerra”, diz Nigro.

Basicamente, uma caixa com duas antenas – uma que controla o comprimento de onda e outra que controla a amplitude de onda -, o teremim é tocado sem se encostar as mãos nele.

“O som é parecido com a voz de uma cantora lírica, é meio sobrenatural”, descreve o diretor musical. O instrumento, que serviu de base para os sintetizadores e a música eletrônica contemporânea, já foi usado, por exemplo, pelo grupo Pato Fu, na música “Eu”, do CD “Ruído Rosa”, de 2001.

Para a vestimenta dos personagens, a figurinista Niura Bellavinha trouxe a inspiração do movimento de arte abstrata encabeçado pelo pintor Kazimir Malevich.

“Essa aproximação que a Flavinha quer fazer com o construtivismo, eu estou buscando uma coisa relacionada ao suprematismo russo, que é da mesma época”, diz ela. “Embora eu entenda e saiba que eu precisa dar uma característica a esse figurino mais maleável, mais humana, porque as figuras do Malevich não tinham rosto. Mas no final das contas, tinham uma expressão muito forte porque estavam associadas a esse sinal do silencio, do não, da negativa do Stálin.”

Bete Coelho gosta de lembrar que o teatro é um trabalho coletivo. Também fazem parte da equipe técnica do espetáculo, o assistente de direção José Geraldo Júnior e o ator Eduardo Estrela, que faz a preparação corporal do elenco.

A iluminação é de Wagner Freire. O diretor de cena e o cenotécnico são João Carvalho Sobrinho e Domingos Varela. A direção de produção fica a cargo de Dani Angelottin e Claudia Odorissio. “Se não tem essa gente pensante, essa gente ativa, não existe nem um monólogo”, ressalta a atriz.

Grupos de WhatsApp da Tribuna
Receba Notícias no seu WhatsApp!
Receba as notícias do seu bairro e do seu time pelo WhatsApp.
Participe dos Grupos da Tribuna
Voltar ao topo

Avenida Victor Ferreira do Amaral, 306, Tarumã - Curitiba - PR