Há uma floresta que anda em Francofonia, o novo Alexander Sokurov, que está estreando nesta quinta, 18, nos cinemas brasileiros. E há um Napoleão que circula pelo Louvre procurando os quadros com os quais se identificar. Diante da Mona Lisa, de Leonardo Da Vinci, ele exclama – “C’est moi!”, sou eu. A frase é famosa e atribuída a Gustave Flaubert, falando de sua heroína, Emma Bovary. Não é uma simples ‘boutade’ (piada) de Sokurov. Aqui mesmo em São Paulo, quando veio convidado pela Mostra – era um dos autores que Leon Cakoff colocava em seu panteão particular -, o diretor russo já dissera não ter muito apreço pelo cinema, mas que era seu destino – sua maldição – trabalhar nessa mídia. Como outra ‘boutade’, ou provocação, Sokurov disse que preferia a literatura. E foi direto ao ponto – “Todo cinema cabe em Madame Bovary.”

Já se aram 14 anos desde que Sokurov fez Arca Russa. Dois anos antes, Cannes celebrara as novas tecnologias, premiando, com a Palma de Ouro, Dançando no Escuro. A Arca de Sokurov provavelmente não teria visto o dia sem o digital, que permitiu ao cineasta visitar o Hermitage, museu de São Petersburgo, ex-Leningrado, num único plano de 99 minutos. O museu interessa ao cineasta como espaço da cultura e da memória – um espaço vivo. Depois do Hermitage, ele visita agora o Louvre, sob a Ocupação (nazista). Foi o subtítulo que o filme recebeu – no original, é só Francofonia. Alguns críticos já observaram que o título se liga muito mais a ‘cacofonia’ e ‘sinfonia’. Falam-se outras línguas que não o francês no filme, mas o espaço é o Louvre. Ali dentro, Sokurov planejou e executou três encontros. O comandante de um navio e ele próprio, numa videoconferência; o encontro de Napoleão e de Marianne, representação da democracia; e o terceiro, o confronto entre Jacques Jaujard e o conde Wolff-Metternich.

Jaujard dirigia o Louvre na época da guerra – a 2ª – e Metternich era o encarregado de Adolf Hitler para executar o ‘Kunstschutz’, programa de proteção do patrimônio dos países inimigos. O ‘proteção’ tem de ser colocado entre aspas, porque o programa, na realidade, visava a expropriar os países inimigos – ocupados – de seu patrimônio artístico e cultural. É um diálogo, ou dois monólogos, fortes, os de Jasujard e Metternich, muito mais que os de Marianne e Napoleão. Ele percorre o Louvre com suas palavras de ordem – ‘Liberdade! Igualdade! Fraternidade”. Mas Sokurov não se ilude. O navio conduz um contêiner cheio de obras de arte que partiu do porto de Bassora. Não há de ser mera coincidência, pois foi em Bassora que o Estado Islâmico destruiu obras que pertencem ao patrimônio da humanidade. O navio enfrenta tempestades – metáfora das dificuldades que a arte e os artistas experimentaram ao longo da história. Sobre o Louvre, avança uma floresta – criada digitalmente -, e desta vez a ‘tempestade’ é emprestada de Shakespeare, Macbeth.

Só para se lembrar, a floresta já se moveu recentemente no espetáculo – videoinstalação – de Christiane Jatahy, também baseada (livremente) em Macbeth. E também recentemente, em Diplomacia, baseado na peça de Cyril Gely, Volker Schlondorff recriou outro encontro, o do cônsul-geral da Suécia, Raoul Nordling, com o oficial alemão a quem Hitler outorgou a governadoria da Paris ocupada, Dietrich Von Choltitz. Conta a lenda que o ‘führer’, enfurecido – e sentindo próxima a derrota -, telefonou a Von Choltitz para fazer a pergunta fatal – “Paris está em chamas"M627.409,331.563L512.604,306.07c-44.69-9.925-79.6-46.024-89.196-92.239L398.754,95.11l-24.652,118.721 c-9.597,46.215-44.506,82.314-89.197,92.239l-114.805,25.493l114.805,25.494c44.691,9.924,79.601,46.024,89.197,92.238 l24.652,118.722l24.653-118.722c9.597-46.214,44.506-82.314,89.196-92.238L627.409,331.563z"/>